sábado, 8 de março de 2014

“Sê plural como o universo!” - foi em 8 de março de 1914, foi há cem anos

Aí por 1912, salvo erro (…) veio-me à ideia escrever uns poemas de índole pagã. Esbocei umas coisas em verso irregular (não no estilo de Álvaro de Campos, mas num estilo de meia regularidade), e abandonei o caso. Esboçara-se-me, contudo, numa penumbra mal urdida, um vago retrato da pessoa que estava a fazer aquilo. (Tinha nascido, sem que eu soubesse, o Ricardo Reis.)


                Ano e meio, ou dois anos, depois lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro – (…) Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira – foi em 8 de março de 1914 – acerquei-me de uma cómoda alta, e, tomando um papel comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com o título, “ O Guardador de Rebanhos”. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre.

Fernando Pessoa (excerto da carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro )

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